Na quinta-feira (05), a 2ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina negou, por unanimidade, provimento ao recurso de apelação interposto pela Tirol em caso de publicidade infantil em escolas. A campanha “Tirolzinho Transforma” tinha como pretexto ser uma ação de cunho educacional de acordo com a empresa de laticínios. Entretanto, a ação se configurava como mais um caso de exploração comercial infantil. Assim, com o improvimento ao recurso, manteve-se a sentença de primeiro grau em sua íntegra contra a empresa de laticínios.
A Tirol foi condenada, em 2019, a retirar qualquer forma de comunicação mercadológica das escolas de Santa Catarina. Ainda, foi determinado que a companhia deveria abster-se de realizar novas ações semelhantes no estado. O Instituto Alana, por meio do Criança e Consumo, fez a denúncia do caso. Além disso, o programa também atuou como amicus curiae no processo judicial movido pelo Ministério Público de Santa Catarina.
O reforço à proteção do espaço escolar frente a interesses econômicos empresariais
No acórdão publicado, o Relator mencionou expressamente o artigo 227 da Constituição Federal, os artigos 4º e 71 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Resolução 163 do Conanda. Essas normas expressam a ilegalidade da prática da publicidade infantil e a proteção das infâncias contra exploração comercial. Dentre os pontos descritos na resolução 163 do Conanda, que auxilia na identificação de ações publicitárias direcionadas a crianças, está a “promoção com competições ou jogos com apelo ao público infantil“, por exemplo.
Ainda, o documento vai de encontro ao precedente do STF, que, por unanimidade entre os ministros, considerou improcedente a ADI 5631, mantendo a vedação de qualquer tipo de comunicação mercadológica em estabelecimentos de educação básica do estado da Bahia. Além disso, o acórdão soma-se aos prolatados pelo TJ-SP recentemente nos casos da Panini e do Show do Ronald, para proteger as escolas da exploração comercial infantil.
“A decisão unânime da Justiça de Santa Catarina quanto à abusividade da veiculação de campanhas publicitárias nas escolas é algo a ser muito comemorado e que vai ao encontro do posicionamento de outros tribunais, inclusive o STF, a respeito do tema. Não podemos admitir que a realização de ações educacionais sirva de pretexto para tentar fidelizar crianças enquanto consumidoras em espaço dedicado à sua formação, e foi esse o entendimento reforçado pela 2ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina”, disse João Francisco Coelho, advogado do Criança e Consumo.
Entenda o processo da Tirol em caso de publicidade infantil em escolas
Entre 2015 e 2016, a Tirol desenvolveu o projeto “Tirolzinho Transforma”. A ação era um concurso com estudantes de mais de 200 escolas no sul do país. Para a divulgação da promoção, a Tirol produziu um vídeo e realizou oficinas de reciclagem. As ações tinham como objetivo incentivar alunos a construírem seus próprios brinquedos e, com isso, divulgar a marca da empresa.
Os participantes do concurso, então, precisavam criar brinquedos utilizando materiais recicláveis. De acordo com o regulamento, deveriam ser em sua maioria embalagens cartonadas e “preferencialmente caixas de leite longa vida Tirol”. As crianças responsáveis pelos brinquedos finalistas receberiam uma bicicleta e uma mochila personalizadas cheias de achocolatado Tirolzinho. Além disso, a escola da criança vencedora receberia R$ 18.000 para reforma de um ambiente do espaço.
Em 2016, o Criança e Consumo enviou uma notificação à empresa por essa prática e, ainda, por outra ação de publicidade infantil em parceria com a novela infantil Carrossel. Logo após não haver mudança na conduta da empresa e continuarem as ações abusivas, foi encaminhada representação ao Ministério Público de Santa Catarina. Em 2018, o MPSC ajuizou ação civil pública contra a companhia e, no ano seguinte, a Justiça condenou a Tirol.
A empresa ainda pode recorrer dessa decisão, então o Criança e Consumo segue acompanhando o caso.
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