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foto em detalhe de mãos de uma criança segurando no guidão de um patinete de madeira

Tempo e espaço para brincar

foto em detalhe de mãos de uma criança segurando no guidão de um patinete de madeira

Tempo e espaço para brincar

 “É no brincar, e talvez apenas no brincar, que a criança e o adulto fruem sua liberdade de criação” (Winnicott)

 

Por Lais Fontenelle, em novembro de 2012

 

Avião, amarelinha, pega-pega, corda, pião. Brincadeira é coisa séria, e para que ela possa acontecer precisamos oferecer tempo e espaço adequados para nossas crianças. Mas, será que isso tem acontecido nos dias de hoje em grandes centros urbanos ou mesmo no interior do país? Quantas crianças vemos brincando pelas ruas, ocupando praças e parques com imaginação e movimento? 

 

Devemos sempre nos lembrar de nossas brincadeiras infantis, pois elas, além de integrar e alegrar nossa memória, fizeram parte de nossa formação social, intelectual e afetiva. Através de nossas brincadeiras, socializamos, nos definimos e introjetamos muitos dos hábitos culturais da vida adulta. O brincar é a linguagem da criança, e é imprescindível para um pleno desenvolvimento infantil.

 

Podemos dizer que, com o passar do tempo, o brincar cedeu lugar a outras atividades que afastaram nossas crianças do exercício da criatividade e da liberdade de expressão. E por que isso aconteceu? A diminuição do brincar criativo é um fato, e suas consequências são múltiplas. As crianças da atualidade perderam as ruas e ganharam as telas. Com a saída das mães para o mercado de trabalho, o aumento da violência urbana e, principalmente, a falta de espaços públicos convidativos e adequados às brincadeiras infantis, o brincar livre e espontâneo saiu de cena e os aparatos eletrônicos convidam nossas crianças à paralisia em frente às telas.

 

É claro que a relação das crianças com as telas é difícil de driblar, e que os brinquedos eletrônicos podem ser bastante interessantes quando usados adequadamente, com a mediação dos adultos, porque estimulam outras aptidões e promovem outras brincadeiras.  Mas, tudo o que é excessivo é prejudicial. Criança precisa de movimento. A energia vital dos pequenos os convida a pular e correr, e para exercício desses movimentos amplos é preciso espaço adequado. As ruas são um espaço de socialização e exercício de cidadania, e por isso é muito importante que as crianças as ocupem.

 

Infelizmente, os espaços públicos atuais são extremamente inadequados. Vemos uma degradação de parques e praças em termos de segurança e limpeza, além de uma enorme violência urbana. No documentário da diretora Estela Renner, Muito Além do Peso, ouvimos tristes relatos de mães que não deixam seus filhos brincarem nas ruas por medo da violência – e isso acaba contribuindo para o agravamento do problema da obesidade infantil. E o que temos feito como cidadãos para reverter esse quadro? Levamos nossos filhos para passeios em espaços públicos ao invés de shoppings? Nos organizamos como comunidade para proteger as praças de nosso entorno? Cuidamos desses espaços em termos de limpeza urbana, ou seja, jogamos nosso lixo no local adequado? Essas são questões importantes. As ruas são nossas e devemos lutar para que sejam cuidadas.

 

Antes de concluir esse texto, gostaria de sugerir outra reflexão, não menos urgente, que trata da apropriação de espaços públicos por marcas. É notório que eventos mercadológicos têm invadido cada vez mais lugares públicos como praias, parques e praças travestidos de convite a brincadeiras para cooptar nossas crianças ao consumo das marcas ali anunciadas. Claro que os eventos são gratuitos, como não poderiam deixar de ser, mas qual é o direito de um cidadão, que paga seus impostos e se incomoda com essa invasão no seu espaço de lazer? Esse debate também precisa ser aberto, porque os espaços públicos já são escassos e inadequados e quando estão em boas condições de uso encontram-se invadidos por marcas. Que tal, então, além de cuidarmos do nosso entorno e educarmos nossas crianças para isso, nos mobilizarmos para que surjam políticas públicas que pensem em espaços mais convidativos a nossas crianças e suas brincadeiras? O brincar é um direito – disso não devemos nos esquecer. As cidades precisam ser mais amigas das crianças.

Publicado em: 26 de novembro de 2012

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