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Foto de uma câmera em primeiro plano, no canto esquerdo inferior gravando uma criança mostrando algo, em frente uma mesa com potes em desfoque como imagem de destaque de texto sobre influenciadores mirins

Influenciadores mirins: expressão cultural ou exploração comercial?

Foto de uma câmera em primeiro plano, no canto esquerdo inferior gravando uma criança mostrando algo, em frente uma mesa com potes em desfoque como imagem de destaque de texto sobre influenciadores mirins

Influenciadores mirins: expressão cultural ou exploração comercial?

O ambiente digital já faz parte do mundo infantil. Não à toa, ⅓ dos usuários da internet são crianças, de acordo com a UNICEF. Nesse mundo digital, assim como existem criadores de conteúdo entre os adultos, essa profissão também chegou para os pequenos. Entretanto, apesar de ser um direito infantil, o ambiente digital ainda não é seguro para esse público. Entre design persuasivo, coleta e tratamento de dados pessoais, micro segmentação de publicidade e tantos outros perigos, como garantir a segurança dos influenciadores mirins frente à exploração comercial?

 

Na última sexta-feira (11), o Criança e Consumo, participou da 10ª edição da Rights Con, um dos maiores eventos mundiais sobre direitos humanos no ambiente digital, no painel Cultural expression or commercial exploitation? The experience of digital kidfluencers is all of our business (traduzido livremente para “Expressão cultural ou exploração comercial? A experiência de influenciadores mirins é uma questão para todos”). Maíra Bosi, comunicadora do Criança e Consumo, e Maria Mello, coordenadora do programa, discutiram sobre o trabalho de influenciadores mirins junto à Dra. Crystal Abidin, professora associada da Curtin University e ao deputado francês Bruno Studer. Ainda, a conversa foi moderada pelo diretor-executivo do CCFC (Campaign for a Commercial-Free Childhood), Josh Golin. Confira, então, o que foi abordado no painel:

 

O trabalho dos influenciadores mirins

A criação de conteúdo na internet por crianças não é, de fato, uma profissão tão nova. De acordo com a Dra. Abidin, os primeiros influenciadores mirins vieram por volta de 2005. E, assim como entre os adultos, muitas vezes o trabalho dessas crianças começa como uma brincadeira. Então, de postagens de vídeos e fotos por diversão, surge uma carreira com obrigações, agenda cheia e contratos. O bem-estar das crianças é apenas um dos seus direitos que acabam sendo ameaçados.

 

“Sobre o bem-estar emocional e financeiro de influenciadores mirins, é importante pensar esses temas separadamente” comentou Bruno Studer na RightsCon. “Quando pensamos no bem-estar emocional das crianças, normalmente, entendemos que é responsabilidade apenas de mães e pais. Entretanto, quando falamos de influenciadores mirins, há um natural conflito de interesses para esses familiares. Ao mesmo tempo que procuram o bem-estar das crianças, também precisam administrar suas carreiras.”

 

Esse conflito de interesses, muitas vezes, também se soma à natural falta de entendimento do cenário empresarial e contratual. Ou seja, mesmo os familiares com as melhores intenções, acabam sendo os agentes desses influenciadores mirins sem a devida instrução. Isso abre brechas para que as crianças sejam exploradas pelas empresas tanto quanto pelos próprios espaços onde trabalham. E “influenciadores mirins estão em todas plataformas digitais, até as não tão visíveis ou acessíveis a todos”, disse Dra. Abidin.

 

“Muito se fala sobre o trabalho de influenciadores adultos, mas pouco ainda sobre as crianças” apontou Josh Golin. “Apenas apontando um exemplo, o youtuber de 9 anos do canal ‘Ryan’s World’ lucrou quase 30 milhões de dólares no ano passado. Seus vídeos, aliás, foram vistos mais de 7 bilhões de vezes.”

 

A exploração comercial infantil

Uma vez que usuários da internet estão à mercê de diversos perigos, isso é multiplicado quando falamos de crianças. E, principalmente para os criadores de conteúdo mirim, que passam o dia inteiro conectados, esse cenário é ainda mais intenso. Algumas empresas se aproveitam da falta de experiência das crianças para explorá-las comercialmente. Isso ocorre não apenas com os seguidores e espectadores dos influenciadores mirins, como também com os próprios criadores de conteúdo.

 

“Não podemos culpabilizar as mães e pais pela exploração comercial infantil na internet” disse Maria Mello no painel da RightsCon. “Empresas também precisam garantir um ambiente digital seguro para crianças, inclusive para influenciadores mirins.”

 

É de suma importância, então, que o trabalho das crianças criadoras de conteúdo seja regulamentado e fiscalizado. De acordo com Bruno Studer, na França, já é caracterizada a atividade de influenciadores mirins como trabalho artístico infantil. Isso quer dizer que, por exemplo, são limitadas as horas trabalhadas, o ambiente utilizado e os contratos realizados. Isso assegura uma série de proteções e, sobretudo, a garantia dos direitos infantis.

 

“Plataformas digitais precisam ser responsabilizadas pela exploração comercial infantil” argumentou Maíra Bosi também na RightsCon. “Afinal, no fim do dia, são elas que estão lucrando com isso. E responsabilizar as plataformas não é apenas retirar um ou outro conteúdo que é denunciado.”

 

Uma maneira de garantir proteção aos influenciadores mirins, de acordo com Bosi, é seguir os direitos das crianças por design. Ou seja, pensar na proteção e no melhor interesse infantil desde o desenvolvimento dos produtos e serviços digitais. E isso não só daquelas para as crianças, mas também de todos que possam impactar os pequenos direta ou indiretamente. Isso significa, por exemplo, que plataformas digitais precisam proteger dados pessoais infantis e impedir que anúncios sejam direcionados às crianças.

 

A publicidade infantil entre influenciadores mirins

Algumas empresas anunciantes sabem muito bem o apelo que influenciadores mirins têm sobre outras crianças e se aproveitam disso. Facilmente, é possível encontrar vídeos e fotos de crianças criadoras de conteúdo patrocinados por marcas. E isso pode ocorrer até de maneira camuflada.

 

“Crianças brincam, aprendem e se divertem juntas, principalmente nesse momento de pandemia” disse Maíra Bosi. “Vídeos de entretenimento como unboxings, mães e pais que só podem dizer “sim”, ou compras imensas em lojas, por exemplo, normalmente são conteúdos comerciais velados. As crianças que se relacionam com esses vídeos, acabam acreditando nos ‘amigos’ influenciadores mirins e querendo o que eles anunciam.”

 

E esse relacionamento entre as crianças que acompanham esses conteúdos com as que os produzem é muito mais intenso do que imaginamos. Bosi lembrou que, recentemente, foi percebido que até os sotaques das crianças estão sendo influenciados pelos vídeos que veem. Empresas utilizam essa ligação entre os pequenos para anunciar seus produtos e serviços diretamente para o público infantil. Essa prática de publicidade infantil é considerada abusiva e, portanto, ilegal no Brasil. A fabricante de brinquedos Mattel, aliás, foi condenada no fim de 2020 por sua campanha “Você Youtuber Escola Monster High”. A empresa contratou uma youtuber mirim para anunciar seus produtos, visto que ela já era muito conhecida entre as crianças. Maria Mello mencionou esse caso na RightsCon, o que foi celebrado pelos outros participantes do painel.

 

Em suma, foi concluído que é de extrema importância que o trabalho de influenciadores mirins seja regulamentado e que essas crianças sejam protegidas. Afinal, como Mello destacou, “as crianças merecem se ver representadas, também no ambiente digital, desde que isso não atrapalhe seu desenvolvimento e fira seus direitos”.

 

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Publicado em: 18 de junho de 2021

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